terça-feira, 22 de maio de 2007

Parecer do Ministério Público (subturma 12)

Os Exmos. Magistrados do Ministério Público, na posição respectiva de amicus curae e de defensores da legalidade, chegaram à seguinte conclusão:

1. Não foi provado qual o conteúdo da pasta entregue ao Exmo. Sr. Manuel Joaquim dos Reis Sapo, Presidente da Câmara Municipal de Rãs do Mar, pela Exma. Sra. Joana Isabel da Ilha, empresária residente no dito município;
2. Assim sendo, nada leva a acreditar num suborno e, como tal, na ocorrência de um eventual desvio de poder por motivos de interesse privado:
3. Caso o deferimento padecesse deste vício, a doutrina acredita ser aquele inválido não em termos de anulabilidade (como referido no presente processo) mas sim nulidade típica, art.º 133.º do CPA;
4. Não foi provado que os originais estavam no Ministério do Ambiente, e estando estes no Ministério da Economia e Inovação, considera-se que houve incompetência absoluta;
5. Não se considerou provado o carácter urgente e de estado de necessidade que teria levado desde logo à iniciação das obras relativas ao empreendimento turístico
a. A fundamentação apresentou-se insuficiente
b. Houve uma efectiva violação do princípio da proporcionalidade por, ainda que para conter a eventual subida das águas, a medida, dos meios idóneos disponíveis para alcançar o mencionado fim, parece que o escolhido não é o necessário nem menos lesivo do interesse dos particulares afectados
c. A construção desde logo de um empreendimento daquela dimensão pareceria ser excessivo;
6. O artigo 17º RJAIA reporta-se à decisão de impacto ambiental (DIA) e não a um simples parecer como mencionado no artigo 15º da matéria de direito contida na petição inicial;
7. O parecer do Ministério Público apresentado não está assinado nem datado, considerando, assim, sem qualquer validade e veracidade;
8. Não foi discutida a fundo a questão do deferimento tácito nem provada a correcta transposição da directiva nº2003/35/CE pelo artigo 19º RJAIA;
9. Parece mais correcta a posição doutrinária defendida pelo Prof. Vasco Pereira da Silva quanto ao deferimento tácito, o qual afirma ser esta “ficção” legal de acto administrativo favorável (permitindo à Administração praticar o acto licenciador) uma má solução, “pois, se a finalidade da avaliação do impacto ambiental é a de autonomizar a apreciação das consequências ecológicas de uma decisão, …, não faz sentido que o legislador permita que o silêncio equivalha ao deferimento”;
10. Não foram provados os interesses turísticos e os ambientais;
11. Os princípios da precaução e do desenvolvimento sustentável não foram utilizados para defender a posição das partes;
12. Estudo de impacto ambiental elabora por Elizabeth Turtle é vago, insuficiente e pouco fundamentado em termos jurídicos e ambientais;
13. Não se mostrou completa viabilidade em transformar os pescadores residentes no município em questão em operadores de hotelaria, na medida em que não teriam a qualificação profissional adequada;
14. Não se verificou o efectivo envio (porque necessário nos termos do artigo 14º, nº5 do DL 69/2000) do «relatório de consulta pública» à Comissão de Avaliação;
15. Quanto à monitorização referida no ponto 3 do International Environment Respect falta a periodicidade necessária àquelas medidas, a qual, não tendo havido DIA, deveria estar consagrada no EIA (Estudo de Impacte Ambiental);
16. As queixas-crimes apresentadas no processo não estão incluídas no âmbito da jurisdição administrativa, pelo que não podem ser apreciadas pelo presente Tribunal.


Conclusão: O MP mostra-se, com as devidas ressalvas feitas anteriormente, contra a construção do empreendimento turístico “Ilha dos Seus Sonhos” em Vale das Rãs, aconselhando à absolvição da instância e a um recomeço de procedimento administrativo-ambiental.


Inês Valério

Joana Baptista

Tânia Esperança

2 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Discordo do parecer o Ministério Público (MP) pelas seguintes razões:
i) No pt. 4 não se sabe qual a relevância dos tipos de documentos que estão no Ministério do Ambiente serem originais ou cópias. Não só o MP não sabe como funciona a Administração, pois nessa lógica nunca poderiam correr dois procedimentos administrativos em simultâneo em ministérios diferentes, já que originais há só um, como acreditou, certamente, que os orgaos que intervem no procedimento de AIA, orgaos da sua maioria do Ministério do Ambiente, foram convocados e dirigidos pelo Ministério da Economia, o que é organicamente imaginável. Além disso, não o MP não diz quais os efeitos no procedimento desta nulidade por incompetência absoluta de acto que nem existe – relembra-se ao MP que estamos a tratar de um acto tácito;
ii) No pt. 5 o MP não diz porque o acto do Presidente da Câmara (PCM) é insuficiente, releva, imagine-se, como fim menos do acto o interesse privado do particular e não o interesse público que justifica o acto, e que é o único que a Administração pode prosseguir, e pronuncia-se sobre o que não se discute no acto de urgência: este apenas determina obras imediatas e o MP releva todo o empreendimento;
iii) No pt. 9 não se sabe a que conclusão o MP chega: afinal o art. 19º AIA viola ou não a Directiva?;
iv) No pt. 10 mais uma vez o MP não fundamenta o seu parecer. Mais: dizer que um projecto destes não tem interesse turístico é completamente hilariante, quase tanto como não valorar a extensão e conteúdo do EIA apresentado por Joana da Ilha, que demonstra não só o interesse turístico, como a protecção do ambiente, e nem se pronunciar sobre ele ou sobre a sua mais valia em comparação com o EIA dos autores, tal como ele é apreciado no pt. 12;
v) No pt. 14 o MP mostra que não estava na sala de audiências. Relembra-se apenas que foi até discutido da veracidade de duas consultas, uma apresentada pela defesa, a verdadeira, outra apresentada pelos autores, falsa;
vi) No pt. 15 o MP desconhece o conteúdo do acto do PCM que impõe o reforço dos “mecanismos de controlo e de cumprimento dos elementos que o projecto contém para prevenir e minorar os eventuais mínimos impactos ambientais que aquele possa hoje previsivelmente ter, durante e depois de concluída a obra”, bem como a criação “de uma comissão permanente de avaliação dos efeitos ambientais da obra”;
vii) No pt. 16 o MP desconhece ainda as suas competências. As queixas-crime foram apresentadas ao MP e não ao Tribunal Administrativo e para que o MP prosseguisse com o procedimento criminal competente, ou seja, nunca passou pela cabeça da defesa que o tribunal administrativo apreciasse qualquer matéria penal, mas isso correu na do MP;
viii) O MP não se pronuncia sobre questões quanto aos meios processuais utilizados pelos autores e invocados pela defesa e quanto à providência cautelar;
ix) Por último, não se percebe qual a decisão do MP. Se os actos são válidos, se o tribunal pode e deve conhecer das questões de fundo, vai o absolver o réu da instância? Ou se são inválidos a decisão é a mesma e prejudica-se a materialidade dos pedidos dos autores?

Durante todo este processo, não sei se a preocupação do MP foi vingar-se do parecer da defesa, argumentando formalmente, se estar na audiência e ler os autos para correctamente se pronunciar sobre a causa!